É impossível ler a perícope de Romanos 8. 24-30 sem levar
em consideração a questão da predestinação x livre arbítrio.
Esse
tema é constante nos meios “evangélicos”, alvo de muitas críticas e discussões
acaloradas para os que se encontram em ambos os lados. Uns defendem o livre
arbítrio, acusando a predestinação de arrogância, pois como pode um homem
dizer-se “escolhido de Deus” como se essa dádiva fosse dada única e exclusivamente
para alguns e outros estivessem condenados. E então pensam: Não! Definitivamente melhor é considerar
que cada um possui responsabilidade sobre aquilo que faz e que se condenado o
problema foi dele que não aceitou a Deus.
Mas
considerar isso também não é arrogância nossa? Pois quem somos nós para
aceitarmos a Deus? Para tomarmos posse do que é nosso...e, o que é nosso
realmente?
Creio
que a única afirmação que podemos fazer com relação ao que é nosso é: o amor de
Deus.
Sim, o amor de Deus é nosso! Mas não porque merecemos ou
porque precisamos, pois o amor é dádiva, é doação do outro, não é mérito de
quem o recebe. E a salvação de Deus é isto, é amor, é doação, é graça
imerecida. Se a salvação fosse por merecimento já estaríamos sentindo em vida
os pés queimando com um calorzinho vindo do inferno.
Jesus,
certa vez nos disse isso ao mencionar que procurou um único justo para morrer por
nós e não encontrou ninguém e então se deu..., por amor.
Levemos em consideração alguns personagens bíblicos. Será
que Jó teve escolha em não passar por tudo que passou? Ele teve livre arbítrio?
Você pode estar argumentando que ele certamente poderia ter amaldiçoado Deus e
morrido como propusera a esposa do mesmo. Mas isso o impediria de passar por
todos os martírios pelo qual passou ou era uma permissão de Deus e quanto a
isso Jó nada podia fazer? E Faraó, ele poderia ter poupado o povo hebreu sob o
comando de Moisés? Ou, ao ter seu coração endurecido por Deus, o mesmo nada
poderia fazer a não ser perseguir os escravos fugitivos? E quanto a Jonas, que
ao ser chamado por Deus, tentou até fugir, mas de nada adiantou. Esses homens
tiveram livre arbítrio? Agar teve livre arbítrio ao ser obrigada a se deitar
com Abraão e depois ter que sair da presença de Sarai com seu filho nos braços?
E quanto a Judas? Ele pode escolher não trair Jesus?
Lembre-se que Cristo
disse: Todavia, a mão do traidor está
comigo à mesa. Porque o Filho do Homem, na verdade, vai segundo o que está
determinado, mas ai daquele por intermédio de quem ele está sendo traído!
(Luk 22:21-22 ARA).
E disse também a Pedro: Simão, Simão, eis que Satanás vos reclamou para vos peneirar como
trigo! Eu, porém, roguei por ti, para que a
tua fé não desfaleça; tu, pois, quando te converteres, fortalece os teus
irmãos. (Luk 22:31-32 ARA) E então...Pedro teve escolha em não negar Jesus ou isso
era um plano de Deus para que o apóstolo entendesse o quanto era vulnerável e
se entregasse verdadeiramente ao amor de
Deus livre de arrogância?
O que nos prende ao não entendimento das escrituras e a
discussões vãs é manter-nos atados a dogmas, a designações que nada tem a ver
com o amor do Senhor. Temos dificuldades ao investigar do que o átomo é
formado, como, pois, queremos ter a pretensão em saber o que se passa na mente
de Deus, em que consistem seus planos?
Nessa altura provavelmente deve estar pensado que este é
um texto tendencioso em prol da predestinação. Não, não é! Este artigo não visa
estigmas, pois só é possível “tentarmos” (haja vista, nossa pequinesa) compreender
os planos de Deus mediante a “desdogmatização” doutrinária.
Dizer isso é negar a predestinação ou o livre arbítrio?
De forma alguma! Os dois existem e convivem juntos, um se realiza no outro.
Tentemos somente por um momento trocar
predestinação pelo sinônimo: prévia
decisão, ou decisão prévia e ao
que chamamos de livre arbítrio chamemos de: livre
agência. Agora como nos ensinou Jesus, tomemos uma parábola para ilustrar
essa questão.
Imaginemos um cientista que faz experimentos com
ramisters. Ele prepara uma caixa de vidro, estrutura essa caixa a fim de
receber e acomodar os roedores imitando assim o mais verossímil possível seu
habitat. E assim mediante um problema, uma pergunta inicial, começa seu
experimento.
Seus ramisters possuem livre agência naquele
meio, podem decidir o que fazer e como fazer, mas não possuem nenhum domínio
sobre qual será o desfecho da experiência. Eles nada podem fazer para sair da
caixa de vidro. Podem correr, pular, nadar, dormir, conforme for o seu desejo...mas,
no fundo estão literalmente na mão do cientista, pois vivem sobre a decisão prévia de quem os colocou ali,
da resposta que o mesmo quer obter através deles; da problemática inicial que o
motivou a colocar os roedores ali.
Isso
não é uma heresia contra Deus, mas simplesmente uma forma de ilustrar o que é
no fundo a “pré-destinação” e o livre arbítrio. Vejamos a questão agora sobre o
prisma teológico:
Assim como o cientista, Deus criou um habitat para nós,
movido por um problema, uma questão inicial. Que motivação foi essa, ou porque fez isso,
não cabe a nós sabermos, pois somos simples roedores. Não temos intelecto
suficiente para compreender a mente do cientista.
Mas dentro da “nossa caixa” temos livre agência, podemos
decidir sobre as coisas pertinentes aos homens, então nesse sentido, sim, temos
livre arbítrio. O cientista nesse ponto observa seu experimento, toma nota das
atitudes dos homens. Contudo, tais atitudes e decisões são motivadas por um
problema inicial, algo que foi proposto por Deus e que só ele tem a resposta,
pois o sair da caixa, depende única e exclusivamente do cientista e não dos
ramisters. A isso se dá o nome de predestinação.
No livro da vida está contido todo o pré-destino dos
homens. Ele é o livro de anotações dos experimentos de Deus. Assim, tudo que
fazemos na caixa já foi milimetricamente calculado, não há nada que o ramister
faça que não esteja nas anotações do cientista, sendo a priori sabido por ele.
E isso é fato!
Os
ramisters não estão ali porque mereceram estar, porque são melhores do que outros
roedores, ou porque escolheram estar. Eles estão na caixa por conta do
cientista e não deles mesmos; pois, nada são a não ser roedores.
Assim também somos nós. O texto de romanos 8 nos mostra
que Deus nos escolheu previamente, o versículo 30 é direcionado como se falasse
a cada um individualmente. Mas isso tudo só é possível porque Deus nos amou.
Ele nos amou antes mesmo de nos criar, ele separou uma parte de si mesmo – Jesus – para nos resgatar, e tudo isso anteriormente a nossa existência. E porque tudo
isso???? Por amor.
Não importa se você deseja ou não ser amado, se merece ou
não. O amor quando é dado é feito com ou sem o consentimento do ser amado e não
há nada que se possa fazer para evitar esse amor. O amor é um presente que será
dado à pessoa mesmo que ela não queira ou mereça receber, pois amor é doação.
Pode-se até tentar ignorar o amor recebido, mas isso não muda o fato de que é
amado.
Portanto, deixemos de lado dogmatismos que só nos levam a
discórdia e a nenhum entendimento. Paremos de discutir sobre qual roedor é
melhor, se os com manchas marrons, ou os branquinhos, ou ainda os cinzas...isso
para Deus não tem a mínima importância!
Quando ele se deu, não derramou uma gota de sangue pelos
presbiterianos, outra para os batistas e mais outra para os metodistas, católicos,
judeus... Ele morreu pelos homens! Debater sobre “o que verdadeiramente é certo”
se predestinação ou livre arbítrio, não nos levará a caminho algum, pois como
podemos discutir sobre certezas se somos por essência errados?
Devemos sempre nos lembrar de que somos ramisters. Não
possuímos a mente apurada do cientista.
O que devemos fazer é pregar o que verdadeiramente
importa: o amor de Deus por nós!
E que a vontade do cientista, conforme está escrito em
suas anotações seja feita e se cumpra em nossas vidas.
Em Cristo,
Renata.