terça-feira, 28 de maio de 2013

Quando o morrer é viver.




Porque para mim o viver é Cristo, e o morrer é lucro.
Filipenses 1:21-22

O homem sempre esteve diante do medo e da dúvida da morte e nunca soube muito bem como lidar com essa questão. Ainda mais em tempos remotos quando o ser humano não possuía um cânon a seguir, não tinha instruções para se basear. Então como os povos mais antigos conseguiam lidar com a questão da morte?

Tomando por base os mitos do Oriente Médio, observamos que os mesmos tratavam a morte como um processo de renascimento, ou seja, “o morrer fazia parte do renascer”. E essas questões de dor e morte eram tratadas dentro do mito de fertilidade de diferentes povos do antigo Oriente.
Então como conceituar “mito” sob o prisma da contemporaneidade?
O escritor Mircea Eliade a esse respeito diz:

Constitui a história dos atos dos seres sobrenaturais;
Essa história é considerada verdadeira e sagrada;
O mito se refere sempre a uma criação, conta como algo começou a existir, ou como um comportamento, uma instituição ou um modo de trabalhar foram fundados. E por isso os mitos constituem os paradigmas de todo ato humano significativo;
Que conhecendo o mito conhece-se a origem das coisas. E desse modo é possível dominá-la e manipulá-la a vontade.
(...) que de uma maneira ou de outra vive-se o mito no sentido em que se fica imbuído de força sagrada e exultante dos acontecimentos evocados ritualizados.

Logo, podemos “simplificar” o conceito de mito como sendo a tentativa de explicar aquilo que o ser humano desconhece, ou seja, o sobrenatural.
Por exemplo, como se deu a criação do homem? Tal arquétipo pode ser encontrado em diversas culturas, sobre diferentes ópticas, mas que convergem para um ponto em comum: um ser supremo e soberano (divino) resolve fazer sua criação (homem).
Observe o excerto abaixo do mito babilônico em consonância com o Gênesis da Bíblia Cristã.

A deusa então concebeu em sua mente uma imagem cuja essência era a mesma de Anu, o deus do firmamento. Ela mergulhou as mãos na água e tomou um pedaço de barro; ela o deixou cair na selva, e assim foi criado o nobre Enkidu”.(SANDARS, 1992, p. 94).

“Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança”.(GENESIS, cap. 1, ver. 26).

“Então formou o Senhor Deus ao homem do pó da terra, e lhe soprou nas narinas o fôlego de vida, e o homem passou a ser alma vivente”.(GENESIS, cap. 2, ver. 7).


             Assim como no relato bíblico que o homem era puro e sem maldade, na epopéia de Gilgamesh há semelhança na narrativa.

“Ele era inocente a respeito do homem e nada conhecia do cultivo da terra. Enkidu comia grama nas colinas junto com as gazelas e rondava os poços de água com os animais da floresta; junto com os rebanhos de animais de caça, ele se alegrava com a água”.(SANDARS, 1992, p. 94).

“Eis que vos tenho dado todas as ervas que dão semente e se acham na superfície de toda a terra, e todas as árvores em que há fruto que dê semente; isso vos será para mantimento. E a todos os animais da terra e a todas as aves dos céus e a todos os répteis da terra, em que há fôlego de vida, toda erva verde lhes será para mantimento”. (GENESIS, cap. 1, ver. 29-30).


            Dessa forma, podemos verificar que o homem procura no mítico uma explicação não só para a criação do mundo, mas para questões mais complexas e que o desnorteia, dentre essas: a morte.
            Sob essa abordagem o mito passa a ser instrumento de sabedoria que guia os povos antigos mantendo-os em comunhão com o “sagrado”.
            Joseph Campbell diz que as tradições mitológicas do mundo ensinam que a morte não é o fim.
            A morte é retratada em vários mitos do Oriente, como no Inanna (deusa mesopotâmia da fertilidade), que a morte significa humilhação; e que todo aquele que por ela passar terá um renascimento do seu ser.
            Assim como no Livro dos mortos, no qual se afirma sobre o mito de Osíris, que o ser humano não é condenado, uma vez que quem morre sobre solo egípcio pode voltar à vida sobre a proteção do deus do cereal (Osíris).
            Semelhantemente como a semente tende a morrer para se tornar fecunda e aprimorar-se como uma planta vistosa, assim o morrer surge como uma necessidade para crescimento do ser humano sob a visão mitológica dos povos mais antigos oriundos do Oriente Médio. 
            Também para nós, o morrer não chega a ser diferente, já que para viver o evangelho puro e simples, é necessário ao velho homem morrer, para que em Cristo uma nova criatura possa viver. Somos postos no mundo como semente que precisa e deve morrer para se transformar em árvore frutífera. Assim, cada semente (ser humano) poderá transformar-se em uma única árvore, com características e serventia próprias, sabendo que cada semente só pode germinar uma única vez.  
O morrer para o mundo nos torna solo fértil para uma nova consciência em Jesus. Assim, só é possível gerar frutos aquele que um dia morreu.