segunda-feira, 23 de julho de 2012

Uma leitura exegética de Marcos 12. 1-12 - Parte II








Contexto Histórico-Social do tempo do evento



Roma em 63 AEC chegou ao Oriente médio começando as invasões partas e árabes e através de tais conquistas a Palestina passou a fazer parte do Império Romano. Posteriormente, Herodes 40-4 AEC obteve de Roma o título de rei e foi sob a dinastia Herodiana, por volta do ano 6 AEC que Jesus nasceu.
Após a morte de Herodes seu reino foi dividido em três e o mesmo confiado aos filhos, sendo a Galiléia e a Peréia entregue ao comando de Herodes Antipas (4 EAC – 39 EC), enquanto Arquelau, reinava sobre a Judéia,  Samaria e Iduméia. Entretanto, devido o ódio que os judeus sentiam deste, o mesmo foi exilado em Gálias e substituído por procuradores romanos, dentre os quais, Pôncio Pilatos (26-36 EC). As demais cidades do reino foram entregues a Felipe.
A sociedade da época estava dividida em zelotes, herodianos, centuriões, publicanos, escribas, saduceus, fariseus, samaritanos. E um novo grupo começava a emergir: os seguidores de Cristo.
Durante muitos anos o evangelho existiu quase que exclusivamente sob a forma oral. Os apóstolos narravam os acontecimentos da vida de Jesus e desses sermões surgiram posteriormente o texto escrito. As palavras de Cristo eram transmitidas, assim, no ensino catequético da Igreja Primitiva.
A sociedade era constituída por um misto de culturas, religiões e convicções políticas. Oriundas de costumes judaicos e romanos.
Não se pode dessa forma desmembrar os grupos que compunham Israel no século I sem adentrar ao campo da política uma vez que tudo para esta sociedade apresentava cunho político.
Segundo a óptica de Robert GUNDRY, em seu livro, Panorama do Novo Testamento, p. 23 e 29 pode-se vislumbrar um pouco melhor a sociedade de então:



“4 milhões de judeus viviam sob o domínio deste vasto Império, o que representava ± 7% da população total do mundo romano [...]. Havia portanto um grande número de habitantes judeus naquela época, dos quais a sua grande maioria, principalmente na região da Palestina, era pobre e em geral alguns eram lavradores e outros porém viviam do comércio e da pesca.
A escravidão entre os judeus não era uma prática muito grande pois a maioria dos judeus palestinos eram tidos como cidadãos livres. Na sociedade judaica não havia muitos desníveis sociais por causa da influência niveladora do judaísmo”[...].


Roma dava certa hegemonia aos judeus e os sumos sacerdotes permaneciam no poder ajudando o governador romano. Há ainda de salientar a importância que o sinédrio, as sinagogas e o templo representavam para esta sociedade.


Sociedade

Como anteriormente mencionado, a sociedade da época engloba um misto de grupos político-sociais, vejamos cada um separadamente.


Zelotes

Este grupo originou-se a partir dos fariseus, contudo seu cunho era mais político que religioso. Era composto em sua maioria por pequenos camponeses e por pessoas oriundas das camadas mais baixas da sociedade que se viam massacradas pelo fisco.
Eram nacionalistas ao extremo e almejavam destituir Roma do poder, pois eram contrários ao governo de Herodes na Galiléia. Seu verdadeiro anseio era restituir a monarquia a YHVH, retomando assim o messianismo do êxodo.
           

Herodianos


Não podemos chamar os herodianos de um grupo social propriamente dito, mas,o fato é que representavam a dependência dos judeus aos romanos, uma vez que possuíam o poder da Galiléia nas mãos. Tinham a incumbência de capturar agitadores e eram considerados os principais opositores dos zelotes. (Mt. 22.16; Mc. 3:6; Mc.12:13)


Centuriões e Publicanos


Os centuriões representavam o poder militar da época e sobre serviço de Roma comandavam 100 soldados. Já os publicanos, embora também representassem o poder romano outorgado, sua incumbência maior estava no âmbito de recolher impostos e por tal motivo essa classe era odiada pelos judeus. (Mt. 9:9; Mc. 2:14; Lc. 5:27).


Escribas


Também conhecidos como doutores da lei possuíam grande prestígio junto à sociedade da época. Por serem intérpretes das escrituras (copistas) os mesmos eram dotados de um amplo campo do saber (administração, direito e educação), e por tal motivo influenciavam a escola, o sinédrio e as sinagogas.
Não eram os mais abastados economicamente, mas, devido ao seu “poder” político-intelectual, tornaram-se os guias espirituais do povo, determinando, até mesmo, as regras para dirigir o culto. 


Saduceus


Este grupo era imponente, formado pelos grandes proprietários de terras (anciãos) e pelos membros da elite sacerdotal. Eram os responsáveis pelo controle do Sinédrio e assim detinham o poder nas mãos, sendo os maiores colaboradores do império romano, fazendo desta forma uma política de conciliação pois temiam perder seus cargos e privilégios. Já no âmbito da religião mantinham uma postura conservadora aceitando somente a lei escrita.


Fariseus


Tratava-se da seita mais segura da religião judaica (At. 26:5) e fora criada no período anterior à guerra dos Macabeus. Seu propósito era o de oferecer resistência ao espírito helênico que havia se instaurado entre os judeus.
Eles sustentam a doutrina da predestinação que consideram em harmonia com o livre arbítrio. Acreditavam na imortalidade da alma e do espírito e, na ressurreição do corpo. Por fim, criam nas recompensas e castigos da vida futura de acordo com os atos cometidos em vida.
A essência de sua doutrina era viver em conformidade com a lei indiferente de sua consequência. Por exemplo, guardar o sábado era algo extremamente importante. No Sabah[1], ou dia do Senhor, não podiam nem ao menos retirar um inseto pousado sobre a roupa, por ser isto considerado trabalho, e no dia santo era inconcebível trabalhar.
Embora buscassem primeiramente as coisas divinas, ou seja, possuíam boas intenções religiosas (a principio), passaram a amar mais a lei do que a Deus, fazendo tudo de forma mecânica, sem o primeiro amor e fervor de Moisés a quem tinham como profeta e exemplo a ser seguido.


Samaritanos
 

Não pertenciam ao judaísmo propriamente dito, pois era um grupo característico da região palestinence. Eles observam escrupulosamente o Pentateuco mais não aceitavam os outros escritos do Antigo Testamento e frequentavam o Templo de Jerusalém.
Eram considerados pelos judeus como raça impura por possuírem miscigenação com estrangeiros. E assim sendo, os Samaritanos motivavam a contenda dos fariseus para com os novos Cristãos, já que os seguidores de Cristo admitiam aos oriundos de Samaria os mesmo privilégios dos judeus no âmbito religioso. (Lc. 10: 29-37; 17: 16-18; Jo. 4: 1-42).



A economia no período de Cristo


A economia da época estava fincada basicamente sobre dois pilares: a agricultura e a pecuária. Estas serviam para subsistência do povo, exportação e sustento dos trabalhos no Templo. 


Profissões e comércio

A principal profissão do período era o artesanato. O próprio artesão fazia e vendia suas mercadorias. Todos  deviam possuir uma profissão, mesmos os escribas. As profissões mais praticadas por estes homens considerados “doutores da lei” eram: fabricante de prego, comerciante de linho, padeiro, curtidor, copista, fabricante de sandálias, arquiteto, comerciante de betume, alfaiate.
Já outras profissões eram tidas como desprezíveis e por tal motivo jamais poderiam ser praticadas por homens tão cultos, como por exemplo, a de tecelão.
A Síria era a principal exportadora de produtos para Jerusalém, dentre eles, a lã em forma de tapetes, cobertores e tecidos. Além destes produtos, a venda de unguentos e resina perfumada também era praticada.
A arquitetura era outro grande ponto de expansão em Jerusalém, uma vez que a família herodiana investia demasiadamente em obras no referido período.
Além dessas profissões havia ainda médicos, barbeiros, lavadeiras de roupas (ocupação tipicamente feminina) e em relação ao Templo existiam os trocadores (que se ocupavam do dinheiro).
Outra atividade importante era a pesca muito praticada devida geografia hidrográfica da região[2] pois havia na Palestina uma grande variedade de pescado abastecendo a nação e até exportando.


Jerusalém: centro comercial da Palestina


Jerusalém era o centro do comércio e transações econômicas. Por ser privilegiadamente a cidade localizada entre portos (Ascalon, Jafa, Gaza e Acra) o mar tornara-se uma rota bastante útil, principalmente com as contribuições marítimas por parte de Roma.
Dois aspectos contribuíram para que Jerusalém abrigasse essa importante atividade comercial, primeiro por ser a capital do Estado e a cidade do Templo e; depois por ser centro religioso e político. Além, de abrigar a corte, a aristocracia sacerdotal e também a nobreza leiga, que traziam consigo grandes recursos financeiros.
Fora Jerusalém, outra importante cidade era Cesaréia que juntamente com a cidade do templo formava uma rota comercial por onde passavam soldados, mensageiros, comerciantes, diplomatas, etc. Gerando, desta forma muito mucro e dividendos para o império.
Dentre os impostos cobrados, existia um específico ao Templo e deveria ser pago em moeda Tíria5 (tetradracma ou estatere). Posteriormente esta mesma moeda começou a ser utilizada também para transações comerciais, assim, uma moeda estrangeira tornou-se moeda do santuário.
Além desse, existia ainda outro importante imposto o  publicum. Este incidia sobre a compra e venda de qualquer produto. Tal taxa foi instituída pelos romanos e cobrada na importação e exportação nas divisas regionais. Os grandes responsáveis pelas cobranças de tais impostos eram os publicanos.

Continua...



[1] Sabah ou Sabá na forma transliterada para o português do Brasil, ou Sabat no português europeu.
[2] A geografia hidrográfica da região se dava através do mar mediterrâneo cortado por rios e muitos lagos.

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